terça-feira, agosto 30, 2016

sábado, março 26, 2016

Ao querido amigo analfabeto político

Por Leonardo Mendes

Peço que não me leves a mal por chamá-lo assim, e considere que isso não é uma ofensa, uma acusação de falha no caráter, nem mesmo culpa tua. E você não é meu inimigo.

Peço então apenas que pondere se não é verdade que nunca te interessaste por política. Se é mentira que até pouco tempo não sabias sequer diferenciar direita e esquerda. Que nunca leste livro algum sobre o tema ou atuaste em movimentos populares ou partidos políticos.

Digo então que não tens culpa, porque desde cedo foste ensinado a ser assim. A não discutir política ou desprezá-la, e tiveste toda a tua natural disposição ao tema – presente no animal político que és – cooptada por um sistema que te quer apenas como consumidor de candidatos, que te convoca a participar apenas de dois em dois anos, e que não te representa.

Como poderias, se desde o império representa os interesses de uma elite da qual tu não fazes parte, o 1% que te ilude diariamente enquanto tentas te informar no Jornal da Globo?

Lembras do editorial de O Globo contra o fim do financiamento a candidatos e partidos por empresas? E aquele contra a taxação de grandes fortunas? Talvez a capa que dizia que o 13º salário acabaria com a economia do país…

Talvez não tenhas te interessado tanto por esses temas na época, porque entre um e outro tinha um mar de lama da corrupção.

O que precisas entender então é que ser contra a corrupção não basta. Que é preciso ir muito além disso, já que hoje as maiores ilegalidades ainda são as permitidas.

Mas foste também convencido pelo 1% de que a legislação é a Justiça. De que os juízes são representantes de Deus na Terra, pois tens no Estado uma representação de teu próprio Deus, que tentas me impor. E esse Deus te garante privilégios, tu hás de convir.

Apesar de analfabeto político, és homem cis, branco, hétero, com pais de classe média. Tiveste acesso a toda educação formal que sonhaste, e hoje és doutor, apesar da crise. Tens também acesso a saneamento básico, plano de saúde e a PM não está em guerra na tua comunidade.

Acreditas então na economia e no mercado, e que basta te esforçares para alcançar tudo aquilo que o 1% recebeu como herança.

Na família Marinho, que tanto escutas, por exemplo, os três irmãos herdaram uma fortuna que hoje chega a mais de R$ 60 bilhões. Isso daria para comprar algo em torno de quarenta mil apartamentos como aquele do Guarujá, que acusas Lula de ser o dono. Ainda assim acreditas que a fortuna dos Marinhos é justa, honesta e meritocrática, e que Lula é o chefe da quadrilha.

Não quero tentar te convencer do contrário, mas sim que percebas que há mais perspectivas entre o céu e a terra.

Que pode parecer mais importante para muitos uma investigação sobre a mídia e seus parceiros no judiciário, do que uma sobre um apartamento de classe média de um ex-presidente.

A desproporcionalidade no tratamento a Marinhos e Lula é diretamente proporcional a diferença dos projetos que representam. Mas tu preferes discutir pessoas a ideias, todos sabem disso, e por isso existe o Big Brother. Não é à toa também que o espetáculo midiático em torno da política se aproxima tanto do entretenimento.

Tu te alimentas de ódios e paixões produzidos por edições maldosas da mídia ou frutos do inevitável destino de toda perspectiva. O que precisas entender é que de nada importa gritar o teu ódio contra corruptos, sendo que não encontrarás ninguém que defenda a corrupção. Não em público, e mesmo Paulo Maluf já disse que confia na justiça.

Peço-te então apenas que, para o bem de todos os cidadãos (tu incluído, nesse grupo tão diverso), leias mais sobre filosofia política, ao invés de assistir a tantos noticiários diariamente. Podes começar trocando meia-hora do tempo dedicado a odiar o Lula em frente à TV, por trinta páginas de Hannah Arendt, por exemplo.

Ou de “A Sociedade do Espetáculo”, da Constituição Brasileira (na parte dos direitos) ou mesmo da Bíblia (nas partes que o pastor esquece).

Sei que estais cansado e que preferes ligar a televisão ou procurar no Facebook as opiniões que queres ouvir, para confirmar as tuas – William Wack, por exemplo, que facilita muito esse processo, e não é sequer preciso assisti-lo pra saber o que ele disse. Mas se desejares realmente deixar de ser um analfabeto político, esse esforço certamente é necessário.

Talvez, em pouco tempo de boas leituras diárias, até te apaixones por política, e pare de utilizá-la para descarregar frustrações ou de visitá-la apenas nas urnas de dois em dois anos.

Mas precisarás admitir que foste assim por muito tempo, e que uma parte tua deseja ardentemente voltar a ser, logo depois de derrubar Dilma e ver restabelecida a paz nos noticiários.

Sei, porém, que não ruminas, então te peço apenas que evite os excessos que te atrapalham a digestão dos fatos. Que evites consumir Eraldo Pereira antes de dormir, ou revistas de fofocas políticas.

Em pouco tempo teu estômago odiará menos, e terás te curado da intolerância à democracia e à diversidade de pensamento. Só assim deixarás de ser um analfabeto político ou, mesmo, um idiota. Um ignorante motivado por lutas inglórias e guerras sujas, emburrecido ou preguiçoso demais para pensar e que decidiu então terceirizar o pensamento.

O Jornal da Globo agradece a audiência.

quarta-feira, março 23, 2016

A vingança conservadora

Wanderley Guilherme dos Santos


É falsa a tese de que o Judiciário se sobrepôs ao Executivo e ao Legislativo. A verdade aterradora é que um grupo de procuradores e juízes-bomba acuou as três instituições da ordem democrática usando a chantagem de se auto explodir, instalando, no ato, o estado natural da desordem. Utilizando um sistema estalinista de espionagem pública e doméstica, sem exceção de pessoas, investigadas ou não, conseguiu a adesão de corpos profissionais, agora sem pudor de promover farsas nazistas de julgamentos prévios e sumários. Sentenças proferidas antes de exame processual, degradação acusatória como substanciação das peças da promotoria, leviandades jornalísticas arroladas como provas irrefutáveis, fatos consumados com apelos à emoção popular, levaram associações profissionais e empresariais a aderir à ilegalidade, tentativa de salvar a face da impotência e medo de seus anéis. Com técnicas de bombardeio durante vinte e quatro horas por dia, pânico psicológico e duplo discurso afirmando fazer o oposto do que efetivamente faz, o grupo de fanáticos já defende sem disfarce a doutrina tirânica de que os fins justificam os meios, subscrita pelos órgãos de comunicação, crônicos sócios das aventuras ditatoriais do País.

É verdadeira a tese de que parte considerável da sociedade brasileira e das autoridades de que depende a integridade democrática tem se mostrado conivente com medidas de duvidoso fundamento jurídico, buscando apaziguar as bestas, tal como os primeiros ministros europeus diante do nazismo e fascismo ascendentes. As redes sociais festejam a próxima caça às bruxas do meio artístico, intelectual, sindical e de profissionais liberais, sem que sejam denunciadas e punidas, sim, punidas, porque convidam à violência e à destruição. Não é recente a revelação das sementes fascistas de parte da opinião pública brasileira. O fenômeno é consubstancial às sociedades capitalistas, e só contido por condições econômicas favoráveis e instituições democráticas vigilantes. À intolerância do irracionalismo sucumbem todos os países, se a oportunidade se lhe oferece, como o provam os péssimos espetáculos contemporâneos das civilizadas sociedades nórdicas, pós-crise de 2008.

A dignidade conquistada pelos pobres e miseráveis, negros, mulheres e minorias discriminadas, não seria esquecida pelo reacionarismo nacional, cultivador de ressentimento e ódio, semeador de ameaças, à espreita da primeira ocasião para vingança. Ela veio de contrabando em investigação pertinente e fundamentada, substituindo personagens e acrescentando ao contingente de comprovados vilões os responsáveis políticos pelo combate à miséria e à discriminação. A sanha vingativa repudia a legalidade e dispensa os ritos jurídicos, certa do silêncio cúmplice dos liberais brasileiros. Estes, outra vez, consomem a ilusão de que não é com eles. Pois a eles chegarão todos os excessos cometidos em nome da purificação política. A vingança conservadora promete cobrar enorme preço pela ousadia de quem a ignorou. Prometem fogo e prometem sangue. Os liberais serão corresponsáveis pela insanidade coletiva, programada pelo grupo de arruaceiros judiciários e inflamada pela imprensa totalitária.

terça-feira, março 22, 2016

A economia política de Lula

João Sicsú


É nítida a diferença entre o projeto de Lula e o daqueles que querem chegar o governo, não importa o caminho: a direita foca seu modelo no andar de cima 



Lula sabe que a inflação faz muito mal para a base social que pretende animar transformando-a em agente da dinamização econômica 

Alinhamento da grande mídia, posicionamento de membros do judiciário, ações da polícia Federal, manobras no parlamento, reações populares e disputas nas redes sociais têm algo que vai muito além da defesa do mandato ou o impeachment da presidente Dilma. 

Nesse momento, há na sociedade brasileira uma disputa de projetos para o país. Muita gente quer derrubar a presidente Dilma, mas não é por conta da corrupção. Se fosse, suas lideranças deveriam ser arautos da transparência e da luta contra a corrupção. 

Mas não são. São sonegadores de impostos, gente que tem conta na Suíça abarrotada de milhões de dólares, investigados em processos de corrupção ou quem tem no serviço público federal remuneração muito acima das regras. O jogo é outro. Apesar disso, ingênuos amarelados bradam contra a corrupção, mas estão nas mesmas fileiras que estão os grandes corruptos. É fácil perceber quem está de um lado e quem está do outro – e quais são os seus interesses econômicos e sociais. 

A favor da derrubada de Dilma e contra a volta de Lula ao governo estão: a FIESP, os bancos, o baronato da grande mídia, a direita, os ricos, as altas classes médias e muitos ingênuos (que bradam sinceramente contra a corrupção). 

Do lado oposto estão a Central Única dos Trabalhadores, o Movimento dos Sem-Terra, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto, movimentos sociais, os marginalizados das periferias, os partidos de esquerda, gente que é de esquerda e não tem partido, democratas e nacionalistas. 

Esses agrupamentos representam interesses sociais e econômicos. Está aqui o objeto da economia política - que estuda a geração de renda, a produção de riqueza, a sua repartição na sociedade e a disputa de cada grupo por uma fatia maior. O que é legítimo. Trabalhador tem que querer maiores salários e empresários, maiores lucros. A questão fundamental é que para uma dada economia, os interesses de uns esbarram ou se confrontam com os interesses do outro lado. 

Esse é o jogo que está sendo jogado. Para a direita e seus aliados é necessário o rótulo da luta contra a corrupção porque isso amplia o seu leque de alianças. Entretanto, a luta é pelo governo para que possam implementar um projeto que atenda aos seus interesses econômicos e sociais. 

A direita e seus aliados desejam concentrar renda e riqueza em suas mãos. E para tanto, precisam reduzir ou acabar com programas sociais, rebaixar salários, cortar benefícios da Previdência, restringir direitos trabalhistas e reduzir recursos para a educação, cultura etc. 

Dessa forma, sobrarão recursos no orçamento federal para que recebam desonerações fiscais, capturem mais juros pelos títulos públicos que possuem, paguem menos impostos sobre seus lucros, recebam incentivos variados para os seus negócios e compartilhem o pré-sal com as petroleiras americanas. 

Eles não acreditam na capacidade nacional de desenvolvimento. Tudo deve vir de fora, produtos, multinacionais, capitais financeiros, projetos, ideias e ideais. Não é a toa que um deputado reconhecidamente corrupto, faz poucos dias, disse: “há muita gente disposta a financiar o negócio do impeachment” - ou seja, é um grande negócio e tem investidores. 

Lula representou, no período 2006-2010, o oposto disto tudo. O grande temor que Lula volte ao governo enquanto ministro da Casa Civil é que o seu projeto possa voltar. O período de 2006-2010 foi um período de forte crescimento econômico, de redução de desigualdades e de ampliação de oportunidades sociais (principalmente, na área da educação). Naquela fase, os empresários e banqueiros também ganharam. 

Eles preferem, contudo, muito mais um modelo parecido com o modelo da ditadura (1964-1985): além de considerarem politicamente mais seguro (inclusive para manter a corrupção), há crescimento com concentração de renda/riqueza e com liberdades democráticas restritas para que não possa haver contestação ao projeto em curso. Uma observação: os militares eram muito mais nacionalistas do que é a direita contemporânea e seus aliados. 

Aqui é fundamental sabermos que para a viabilização de projetos que concentram renda e riqueza e eliminam oportunidades sociais é necessário também limitar liberdades democráticas. É preciso ter leis e a justiça no mesmo projeto. A insatisfação dos de baixo deverá ser contida pela polícia e pelas forças armadas que cumprirão ordens dadas pela legalidade judicial. 

Em sentido oposto, Lula no ministério poderá recuperar a governabilidade, recuperar a economia e se tornar um candidato competitivo em 2018. Bastaria Lula fazer o governo reencontrar o modelo econômico e social do crescimento com geração de empregos, inclusão e distribuição de renda. 

E isso é possível. O foco de Lula é nos pobres e nos trabalhadores que fazem com que as políticas econômicas sejam potencializadas. É fácil entender. São milhões gastando tudo o que recebem e com isso fazendo o roda gigante da economia (que está parada) girar rapidamente. 

É exatamente aqui que fica nítida a diferença entre o projeto de Lula e o projeto daqueles que querem chegar ao governo já, não importa o caminho. A direita e seus aliados focam o seu modelo econômico no andar de cima: multinacionais, latifundiários, bancos, os ricos, milionários e as altas classes médias. Além da concentração de renda e de riqueza que pretendem realizar, deixarão a condução do Estado brasileiro e da economia para os mercados financeiros, as multinacionais e os latifundiários. 

Tudo indica, entretanto, que Lula nomeado ministro fará o governo esquecer a reforma fiscal e da Previdência anunciadas pelo ministro da Fazenda. Lula contaminará o governo e agentes econômicos e sociais para um grande projeto de geração de empregos e renda, tal como provou que é capaz de fazê-lo no seu segundo mandato. 

Isso não significará irresponsabilidade fiscal ou desconsiderar a necessidade de manter a inflação sob controle. Muito pelo contrário, a recuperação da economia fará a receita tributária aumentar e haverá o reequilíbrio das contas públicas. Além disso, Lula sabe que a inflação faz muito mal para a base social que pretende animar transformando-a em agente da dinamização econômica. 

Lula tentará conduzir o governo para governar para 175 milhões de brasileiros, enquanto o projeto da direita e seus aliados é governar apenas para 30 milhões. Lula desejará reduzir desigualdades de renda e de oportunidades. 

A direita e seus aliados pretendem concentrar a renda, a riqueza e para tanto precisam conter a rebeldia dos debaixo reduzindo a liberdade de manifestação para fazer contestação. Portanto, o que está em jogo são projetos para as próximas décadas, mais que um governo ou dois governos. O jogo é muito mais sério do que o combate à corrupção que para ser reduzida não é necessário destituir a presidente, já que contra ela não existe nenhuma acusação dessa natureza. 

Em conclusão, milhares, talvez milhões, de inocentes poderão ser vítimas dos seus gritos e atos de violência caso não percebam que o que está em jogo são projetos - cada qual com a sua economia política que busca atender interesses de segmentos sociais específicos. É preciso saber de que lado cada um estará. Do lado da redução das desigualdades e da busca por justiça social ou do lado oposto. Não existe terceira via. 

quarta-feira, março 09, 2016

Frase

A prática da arbitrariedade não a legitima. (Cristiano Zanin Martins)

Frase

A força da alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos: quando apenas conseguem identificar o que os separa e não o que os une. (Milton Campos)


segunda-feira, março 07, 2016

Teoria do solidarismo



Se todos os homens são interdependentes, aqueles que gozam de uma vantagem devem uma compensação aos demais. A sociedade representa um conjunto em que todas as partes estão estritamente unidas umas às outras, como as partes do corpo humano. Os exitosos são os que têm sabido aproveitar-se da ação dos outros, portanto são seus devedores. (Léon Bourgeois)

terça-feira, março 01, 2016

Um novo direito

Carlos HP Vieira

Falam mal da esquerda associando-a ao governo, mas não se dão conta de que o governo é de direita. As razões:

1. adoção do programa de ajuste fiscal do adversário derrotado
2. ataque indiscriminado aos direitos sociais, trabalhistas e previdenciários
3. governa para bancos e rentistas com juros altos
4. R$ 500 bilhões do orçamento estão destinados a pagar juros da dívida pública
5. não moveu um músculo em defesa da Petrobras

A velha direita o ataca pelo estelionato eleitoral que a revelou e todo seu modo de agir.

A esquerda autêntica precisa abrir os olhos e saber que a luta contra a direita e a favor da justiça social não pode ser através do atual ordenamento jurídico porque ele é fruto da injusta ordem neoliberal para mantê-laA direita já sabe - e age assim - que auctoritas, non veritas, facit legem [é a autoridade, não a verdade, que faz a lei]. Urge que a verdadeira e genuína esquerda também saiba e aja assim para impor, com um novo direito, a justiça social e os seus generosos valores.

Nesta ordem jurídica neoliberal, summum jus, summa injuria [excesso de direito, excesso de injustiça].

segunda-feira, fevereiro 29, 2016

De Mastins e de Poodles

Mauro Santayana

No day after da aprovação pelo Senado de proposta que  muda as regras do pré-sal, abrindo caminho para leilões de novos campos de petróleo e para a aprovação pela Câmara de projeto ainda mais vergonhoso, que prevê o fim do regime de partilha e a volta ao regime de concessão que vigia até 2010, estabelecido nos “fantásticos” tempos de FHC, autoridades norte-americanas movem mundos e fundos para impedir a compra, pela poderosa estatal chinesa ChemChina, da multinacional química Syngenta, por 44 bilhões de dólares.

Embora de origem suíça, a Syngenta tem forte presença no mercado agrícola norte-americano, onde está cotada em bolsa e conta com acionistas  como o Bank of America e o fundo de investimentos Blackrock.

Com essa atitude, os EUA querem também evitar que Pequim reforce sua posição na área de transgênicos prejudicando direta e indiretamente grandes empresas norte-americanas do setor, como a Monsanto - ao contrário do que ocorre no Brasil, os chineses tratam as multinacionais de sementes e defensivos agrícolas estrangeiras com rigor e são extremamente cuidadosos na liberação da venda de seus venenos e organismos geneticamente modificados em seu território, um dos maiores mercados do mundo. 

A pseudo “massa” ignara, abjeta, fútil e fascista, que pulula pela internet e pela mídia conservadora brasileira, deveria aproveitar o seu pegajoso pró-norte-americanismo para aprender a diferença entre os EUA – e outros países com P maiúsculo na administração de seus interesses - e o Brasil: por lá, quando se trata da entrega de setores ou mercados estratégicos para potências concorrentes, os mastins nacionalistas dos Estados Unidos ladram e rugem - mesmo quando não se trata de empresas 100% norte-americanas – e arreganham os caninos, enquanto, por aqui, nossos delicados poodles entreguistas antinacionais fazem festa para os gringos, e balançam, arfantes e em êxtase, os rabinhos.

terça-feira, fevereiro 23, 2016

Havana

O mundo chega em Havana em hordas cada vez maiores. Nas ruas de paralelepípedos de Habana Vieja, a cidade antiga lindamente restaurada, agora pode ser difícil mover-se entre as multidões dos grupos turísticos. Eles seguem seus guias com bandeirinhas entre as praças rodeadas de cafés, saem do Museo del Chocolate, passam por estátuas vivas e franquias de Victorinox e Diesel e chegam a butiques que ocupam majestosas mansões antigas, onde relógios feitos à mão são vendidos por 12 mil dólares.
Não muito tempo atrás, tudo isso estava a ponto de desmoronar. A improvável transformação é obra do escritório do Historiador da Cidade, um vasto departamento estatal de arquitetos e urbanistas chefiado por Eusebio Leal Spengler desde 1981. Com um poder sem precedentes para um historiador da arquitetura, equivalente ao de um prefeito, ele ganhou aplausos da Unesco e de órgãos de preservação de todo o mundo pelo que conquistou aqui nos últimos 30 anos, contra todas as expectativas.

No início dos anos 1990, Leal convenceu Fidel Castro a montar uma empresa estatal de turismo, a Habaguanex, companhia encarregada de desenvolver hotéis, restaurantes e lojas. Crucialmente, ela usaria os lucros para restaurar os edifícios e as ruas abandonados de Havana, além de promover projetos sociais e instalações para a comunidade. Foi um modelo cauteloso de tática capitalista usada para fins socialistas, que viu o departamento de Leal canalizar mais de meio bilhão de dólares para a cidade antiga. Hoje, a companhia dirige um império crescente de 20 hotéis, 40 restaurantes e 50 bares e cafés, assim como dezenas de butiques de luxo.

segunda-feira, fevereiro 08, 2016

Mensagem do primo Antonio Eugênio


Primos,

No intermédio das mensagens do dia, fiz um provocação,no bom sentido, para esquentar o debate político. Acho, que no fundo todos nós gostamos uma vez que mantemos o respeito e não agressão às opiniões dos que participam e acompanham. Estendo-me um pouco mais ( aceitando a provocação do Renato) sobre a questão dos países no intrigado sistema político- ideológico mundial. Lembro o seguinte: o maior país democrático do mundo, os EU, adota o sistema capitalista da livre iniciativa e liberdade de expressão. O maior bloco socialista do mundo, a URSS, tornou-se um governo tirano com Stalin, causando assassinatos e prisões a quem divergia de seu sistema político-ideológico. Somente após1987, com a reforma ( Perestroika) e independências dos países da Europa oriental, puderam usufruir da liberdade. Após o término da 2a Guerra Mundial, os países livres passaram a temer a URSS. Os EU que saiam da guerra numa situação economicamente soberba, sem nunca seu território ter sido bombardeado, infelizmente foi tomado à época por um movimento militarista que tinha grande trânsito e influência política no Congresso americano, instalando dezenas de bases militares em torno do mundo. Esse fato criou e desenvolveu o grande interesse das indústrias armamentistas, persistindo até hoje, por conflitos fora do país, em nome da defesa de um mundo livre. Na economia, após o final da guerra em 1945, de bom aconteceu o desenvolvimento econômico dos países europeus e do Japão, e o surgimento dos Tigres Asiáticos ( esses com mão de obra barata e uma rígida disciplina e hierarquia religiosa adquirida através do budismo), causando o equilíbrio das forças econômicas mundial. A economia capitalista provocou no mundo inteiro o progresso de suas civilizações, principalmente em termos materiais e científico. A URSS até recentemente só tinha produzido o Sputinik. Tanto a URSS e, mais recentemente a China, aplicaram em sua economia socialista, dois instrumentos da econômicos capitalistas: a propriedade privada e a utilização de bolsas de valores em suas negociações. Somente a partir daí, houve progresso de suas economias. O sistema capitalista, além das forças econômicas de interesse armamentistas citadas, cometeu outros erros como o do capital financeiro que se encontra hoje em constante processo de regulamentação em busca do seu aperfeiçoamento. Às nações emergentes e em desenvolvimento, sem a pungência de suas economias,deveria adotar um sistema de economia mista liberal e política de estado, encontrando o tamanho do Estado ideal a ser utilizado, em função de suas naturezas, necessidades e características culturais do povo de cada nação, determinandoas proporções devidas entre os princípios do Estado de Direito e do Estado Social ( capitalismo x socialismo, ponderação do Noberto Baggio, do Caíque). Infelizmente, no Brasil atual, o Estado é incompetente para garantir os dois princípios tão importantes para uma democracia, Parece que estamos de acordo quando comungamos a não aceitação dos sistemas extremos dos regimes capitalismo ditatorial e socialismo ditatorial. Quem sabe um socialcapitalismo que alguns não acreditam. Ufa!

Abraço,

Antonio Eugênio.




Mensagem ao primo Antonio Eugênio




Antonio Eugênio,

Como não existe neutralidade em nenhuma produção de conhecimento, o seu texto não fugiu à regra e nem será o meu que fugirá. O que quero é fazer aqui um contraponto e propor sempre serenidade para saber olhar os dois lados, bom e ruim, das nações.

A URSS ficou satanizada pela propaganda pesada da guerra fria, sobretudo pelo período stalinista que durou 31 anos, de 1922, quando Lênin sofreu um derrame que o matou em 1924, até 1953 quando Stálin morreu. Só que o país socialista durou 74 anos, de 1917, quando foi invadido por 14 países hostis à revolução, até 1991. Então, se você fizer a diferença, 74-31= 43 anos, um período maior do que o período stalinista onde várias coisas boas aconteceram e bem que poderíamos ser mais gratos por elas:

1. a sua importante e dramática participação na 2a. guerra e na vitória sobre Hitler.
2. os direitos da mulher
3. a legislação trabalhista
4. o anticolonialialismo
5. a alfabetização universal e gratuita
6. a elevação de vida da classe trabalhadora
7. o desenvolvimento artístico de grande qualidade.

A perestroika e a glasnost de Gorbachov que tentava mostrar ser possível conciliar igualdade e liberdade individual foi solapada pelo ocidente dando força e apoio ao seu protegido, Boris Yeltsin, que deu no que deu: desmantelaram a URSS, grupos mafiosos tomaram o poder e a esculhambação reinou. A Rússia hoje retoma aos poucos a sua grandeza.

Os EUA entraram tardiamente na guerra, em 1941, mas só em 1943 foi que Roosevelt enviou um contingente mais expressivo de soldados norte-americanos para o Egito, onde venceram as tropas alemãs na Batalha de El Alamein. Outra importante participação dos EUA foi o desembarque na Normandia (França), que juntamente com os aliados venceram o exército alemão e a cidade de Paris voltou para o controle da França, antes dominada pelos alemães. Perderam 300 mil vidas, todos eram soldados, não havia civis. Foi o país que mais lucrou com a guerra.

Jamais devemos esquecer: URSS e EUA foram parceiros nesta guerra. A URSS por ter perdido 25 milhões de vidas de civis e soldados e mais a besteira de ter entrado em competição com o capitalismo, desperdiçando seu capital no orçamento militar, se enfraqueceu economicamente e acabou se desmantelando.

A nação mais rica do mundo, com muitas coisas para se elogiar, se divulga como a mais democrática do mundo, mas é onde acontecem os seguintes fatos, cito só esses para não ficar extensa e cansativa a lista:

1. 22% das crianças americanas vive abaixo do limiar da pobreza.
2. entre 1890 e 2012, os EUA invadiram ou bombardearam 149 países.
3. os EUA são o único país da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) que não oferece qualquer tipo de subsídio de maternidade.
4. 125 norte-americanos morrem todos os dias por não poderem pagar qualquer tipo de plano de saúde.
5. os EUA foram fundados sobre o genocídio de 10 milhões de nativos. Só entre 1940 e 1980, 40% de todas as mulheres em reservas índias foram esterilizadas contra sua vontade pelo governo norte-americano.
 6. O preço médio de uma licenciatura numa universidade pública é 80 mil dólares.

György Lukács, um marxista húngaro, escreveu, em francês, sobre o socialismo: "charbons ardents d'un grand feu éteint" (carvões ardentes de um grande fogo apagado) porque ninguém vive sem uma utopia. O capitalismo é um sistema que se mostrou apto a gerar riqueza e - inapto a distribuí-la - pobreza. O nosso querido e insuspeito primo, o Itamaraty, o Pedra Rosa, o Pedrosa ficou pasmo ao saber que o 1% mais rico do mundo possui o equivalente ao que possui o restante 99%. Conciliar a igualdade com a liberdade individual, o sonho de Gorbachev na sua glasnost e perestroika, e o nosso também, não é fácil, sobretudo num país como o Brasil. Henri Dominique Lacordaire nos alerta: "Entre fortes e fracos, entre ricos e pobres, entre senhor e servo é a liberdade que oprime e a lei que liberta". É uma lição que fundamenta o nosso repúdio ao neoliberalismo econômico. Nossa Constituição dita o capitalismo como o modo de produção do país, pelo menos que a sua segunda vertente, a social democracia, seja a que prevaleça em nossas escolhas por ser a mais moderna e razoável.

Abraço,

Caíque.

quarta-feira, janeiro 27, 2016

A despedida de Brasilia - 25/01/2016

Já nos despedindo da memorável temporada em Brasilia, almoçamos com João, Leliana e família no excelente restaurante do clube de golfe cuja honestidade merece ser destacada. Na conta veio discriminado o valor a ser pago por pessoa, dividiram o total por 12. Usamos esse valor individualmente, só que, na realidade, éramos 14. Não tivemos o cuidado de somar as parcelas que acabou superando em R$400,00 o valor total. Já estávamos lá fora quando o garçom veio nos avisar do erro. Agradecemos o que deveria ser corriqueiro, a honestidade.

De lá fomos para o acolhedor jardim da casa do João que levou o Freitas e a Inez para conhecer as instalações do bem estabelecido escritório LM Rolim Advogados Associados. Agradável tarde de convivência regada a cafezinho com bolo de macaxeira (Mané pelado), receita da mamãe. Conversamos  sobre política, assuntos do nosso grupo de primos e fui presenteado com o livro "La Habana - Transformacion urbana en Cuba". Quero registrar aqui a hospitalidade e o respeito que prevaleceu nas conversas quando o tema era política, normalmente tormentosas através do nosso grupo e facebook. Despeço-me com gratidão e anseio que a gente conserve essa harmonia e respeito por nossas preferências político-ideológica, condição necessária e suficiente para o enriquecimento da amizade que, no final das contas, é o que vale. 

Interpretação do sonho - 22/01/2016 - 28 anos da Beatriz

Beatriz e João Victor sendo primos e netos de primos, sempre foi uma preocupação para mim um filho deles. Conversávamos sobre isso numa noite em Jericoacoara e acabei sonhando que ela dava a luz a um peixe. Fiquei encasquetado com esse sonho. Hoje, conversando no café aqui na casa da Beatriz, o Freitas, psicanalista, marido da Inez, me dizia que os sonhos são restos do dia e sempre simbolizam desejos. A partir do fato de que associo o peixe a um dos símbolos do cristianismo, além de achar um dos alimentos mais saudáveis, ele interpretou esse sonho como meu desejo de que um filho deles seja abençoado com a graça da saúde. Simples assim.

A lição de Roosevelt ao Brasil de Dilma

A lição de Roosevelt ao Brasil de Dilma: Roosevelt queria que a produção e o emprego prosperassem, e sabia que isso não aconteceria sem atacar o rentismo que suga a jugular dos trabalhadores.

quinta-feira, janeiro 07, 2016

Diálogos e convergências



Diálogos e convergência 

De vez em quando, há um certo estranhamento dos outros em relação à minha posição política mais à esquerda, já que sou neto e filho de empresários. Essa posição já expliquei no texto "A boa fonte".

Meu avô morreu dois dias antes do meu aniversário de 13 anos, nessa idade não temos consciência política. Soube, mais tarde, que ele não gostava de Getúlio Vargas e se entristecia com um filho, meu tio, que gostava. Quanto a mim, não tinha a menor ideia quanto a política e a ideologia provocam paixões que podem destruir relacionamentos, eu simplesmente gostava do meu avô e não seria a ideologia que destruiria esse bem-querer.

A minha convivência com meu pai foi constituída por duas fases que correspondem a dois sentimentos: a primeira, a da infância, onde predominava o medo que eu tinha dele. Nessa fase eu poderia até dizer que eu gostava mais do meu avô do que dele. Meu avô era para mim uma figura masculina mais carinhosa; e a segunda, a da juventude, quando começamos a jogar futebol, a dialogar e a convergir. De início, conversávamos muito sobre música (ambos tocamos piano), depois sobre a segunda guerra mundial e, mais tarde, sobre política. Nessa fase começa minha grande afeição por ele, este é o sentimento que predomina. Todo meu gosto pelo jazz vem daí, assim como meu interesse por geopolítica se inicia pelas informações que ele me dava sobre a segunda guerra. Na política divergíamos, ele pendia para a direita e eu para a esquerda, mas há uma curiosidade que poucos sabem: em 1986 surge um jornal semanal alternativo, o JD (Jornal do Dorian), cujo diretor era o Dorian Sampaio e o editor, o Blanchard Girão, dois jornalistas de esquerda que eram amigos de meu pai. Nós dois assinamos o JD e sempre conversávamos sobre os assuntos da semana, principalmente sobre a coluna do Blanchard. Comecei a notar alterações no ponto de vista político dele, uma leve guinada à esquerda, e à nossa convergência. Em uma das semanas, li na coluna do Blanchard a carta de um anônimo que me pareceu familiar pelos pontos de vista que pareciam com os do meu pai e lá no final o autor se identifica como um ex locutor da PRE-9. Pronto, deve ser o papai, imaginei. À noite fui na casa dele que me confirmou. Mas não era o primeiro sinal de simpatia dele pela esquerda, em 1985 ele havia votado na Maria Luiza Fontenele para prefeita de Fortaleza.

Escaneei a carta que está publicada abaixo. Este JD circulou no dia 24 de julho de 1986. No ano seguinte, no dia 20 de abril de 1987, meu pai faleceu e, poucos meses depois, fui assistir a uma palestra do Blanchard Girão onde, no final, me apresentei a ele com o jornal em mãos. Ele me deu um caloroso abraço e me disse que desconfiava que a carta era de meu pai pela menção à PRE-9.