segunda-feira, outubro 17, 2005

Três poeminhas telúricos







Carlos Henrique de Pontes Vieira


a borboleta

num vem e vai
útil ou à toa
...poor butterfly...
me sobrevoa

de flor em flor
e, como a flor,
a asa dela
é tão singela!

depois da lida
a colorida
pousa em mim
e fica assim...

o passarinho

se eu pudesse ser um passarinho
eu seria, eu seria, eu seria
beija-flor, canário ou cotovia
só cantava alegria, alegria

voaria sempre em liberdade
viveria uma vida sem maldade
distraído e alegre com meu canto
sem ter medo, raiva ou desencanto

eu queria ser um passarinho
com uma passarinha no meu ninho
pra poder dormir aconchegado
ah, que sono bom e sossegado !

a formiga

oh formiguinha que vai trabalhar
por que tu não páras pra arejar ?
faz o mesmo que a cigarra fez
larga de mão deixa disso uma vez

vai cantar, cria asa e vai voar
até a hora que o sol brilhar
por que o desejo de acumular ?
ora, a vida, enfim, vai já passar...

sexta-feira, outubro 14, 2005

A Utopia







Eduardo Galeano (Uruguaio)

A utopia está lá no horizonte.
Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos.
Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei.
Para que serve a utopia ?
Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.

quarta-feira, outubro 12, 2005

A arte de Amar










Manuel Bandeira


Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus – ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.

segunda-feira, outubro 10, 2005

Palabra










Viviana Benz (Chilena)
Tengo la certeza que cuando abandone el mundo
La última palabra será
El mundo fue un caso perdido
***
Tenho a certeza que ao abandonar o mundo
a última palavra será
o mundo foi um caso perdido

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Murais chilenos da década de 60. Clique aqui:
www.lainsignia.org/album.html

quinta-feira, outubro 06, 2005

Humildade









Cora Coralina.


Senhor, fazei com que eu aceite
minha pobreza tal como sempre foi.

Que não sinta o que não tenho.
Não lamente o que podia ter
e se perdeu por caminhos errados
e nunca mais voltou.

Dai, Senhor, que minha humildade
seja como a chuva desejada
caindo mansa,
longa noite escura
numa terra sedenta
e num telhado velho.

Que eu possa agradecer a Vós,
minha cama estreita,
minhas coisinhas pobres,
minha casa de chão,
pedras e tábuas remontadas.
E ter sempre um feixe de lenha
debaixo do meu fogão de taipa,
e acender, eu mesma,
o fogo alegre da minha casa
na manhã de um novo dia que começa.

quarta-feira, outubro 05, 2005

Celso Furtado e a dialética do desenvolvimento


Leda Paulani


Ao longo de sua vida, o economista assistiu ao processo de industrialização do país e a sua entrada na terceira revolução tecnológica. Em todos esses momentos, como previu, a modernização descontrolada produziu atraso e subdesenvolvimento.

Diz o filósofo francês G. Lebrun que a dialética é uma máquina de moer significações até elas confessarem que não são nada. Consciente disso ou não, Furtado trabalhou dialeticamente quando criou o conceito de subdesenvolvimento. Ao afirmar e mostrar que o subdesenvolvimento, contrariamente ao que apregoavam as teorias mais convencionais, não é uma etapa do desenvolvimento, mas um tipo específico de desenvolvimento, Furtado mostrou que, se não for acompanhado de soberania, de distribuição minimamente eqüitativa de riqueza e renda, de equilíbrio regional, de sociedade civil forte e de Estado democrático, o desenvolvimento capitalista pode significar subdesenvolvimento. Em outras palavras, se não forem produtos de um projeto de nação em execução, crescimento e modernização capitalista, ao invés de sinais do desenvolvimento, podem significar afirmação do seu contrário.

Em tempos tão minguados para a reflexão e o debate, nestes tempos de tirania do pensamento, em que a discordância da orientação mercantista é tachada, sem a menor cerimônia, de burrice, incompetência, ou, na melhor das hipóteses, de atraso, romantismo e utopia, nestes tempos, enfim, que sua morte torna ainda mais melancólicos, quando questões como as acima referidas saíram completamente de moda, cabe lembrar brevemente as lições do velho mestre. Nos anos de 1950, sob os profícuos eflúvios da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal), e preocupado que estava em descobrir as causas de nosso crônico atraso, mesmo depois do “deslocamento do centro dinâmico” e do abandono do modelo agrário-exportador, Furtado toma a dicotomia que Raúl Prebisch ia consagrando e resolve trabalhar com ela de modo diacrônico. Em sua autobiografia ele afirma que estava interessado no desenrolar dos acontecimentos no tempo, de modo que substituiu o par centro-periferia, essencialmente sincrônico, pela idéia de “economia colonial”, já que ela lhe permitia inserir o país em seu quadro histórico. Em função disso, ele percebeu que a deterioração dos termos de troca, descoberta por Prebisch, constituía na realidade o corolário natural da vinculação Metrópole-Colônia e um aspecto particular e historicamente específico da tendência geral do capitalismo de concentrar poder econômico.

Isto posto, o desmonte da armadilha que enredava o país no modelo anterior (agrário-exportador), impedindo-o de realizar todas suas potencialidades, havia sido possível graças à contingência histórica criada pela crise de 1929. Mas esse desmonte, se era condição necessária para a construção da nação e para a superação do subdesenvolvimento, não era de modo nenhum condição suficiente. A despeito da industrialização, que brotara com força, o país continuava “atrasado”, tolhido, com largos contingentes de sua população empurrados pela miséria de regiões esquecidas pelo crescimento e pela modernização, os quais iam se incorporando, sem se integrar, à “vida moderna” das cidades que se agigantavam. Esse desenvolvimento capenga, manco e desequilibrado, suspeitava Furtado, tinha que ver com a natureza de nosso passado colonial, com o caráter pouco burguês de nossas elites e com a crônica abundância de mão-de-obra que marcava a história brasileira.

Eram esse passado e essa situação que produziam o que Furtado denomina “desenvolvimento tecnológico dependente”. Funcionando às avessas, o avanço tecnológico sempre chegava por aqui através da difusão dos bens de consumo que sua evolução produzia nos centros do sistema. Seu ponto de chegada era para nós seu ponto de partida. Por isso, dirá Furtado, ele nunca se limita à introdução de novas técnicas, mas impõe a adoção de padrões de consumo e conseqüentes modos de vida que implicam um grau de acumulação absolutamente não universalizável para um país de periferia. Contudo, a permanência e o aprofundamento desse tipo de movimento só vinham sendo possíveis no Brasil porque essa sorte de “progresso capitalista” podia ir em frente ignorando a inexistência de um mínimo de homogeneização social. A congênita superoferta de força de trabalho é que era a responsável pela facilidade com que historicamente as classes abastadas decidiam que destino dar ao excedente econômico.

Assim, para sair desse círculo de ferro em que desenvolvimento produzia atraso e subdesenvolvimento, Furtado prescrevia o fortalecimento incondicional da sociedade civil, o abandono das idéias convencionais sobre vantagens comparativas e a adoção do planejamento como instrumento primordial do Estado, preservando o país das forças cegas do mercado. Essa postura permitiria completar o processo de industrialização, planejar a redução das desigualdades regionais e de renda e fortalecer o mercado interno para que ele não fosse destronado do posto de baliza do desenvolvimento do país a que tinha sido guindado pelo acaso histórico da crise mundial de 1929.

Furtado morre cinqüenta anos depois de ter escrito boa parte dessas reflexões. Viveu o suficiente para ver o quão certo estava. Assistiu à implantação de chofre do setor de bens duráveis de consumo, depois à conclusão do processo de industrialização com a constituição do departamento produtor de bens de capital e de insumos básicos e finalmente à entrada do país, mais uma vez de revés, na terceira revolução tecnológica do mundo globalizado. Em todos esses momentos, como não foram tomadas as providências que ele prescrevera, a modernização produziu atraso e subdesenvolvimento, e produz agora também barbárie. Os vinte anos de ditadura que ocorreram de permeio moeram a sociedade civil e sua capacidade de atuar como elemento determinante no processo de conclusão da construção da nação. A entrada do país no maravilhoso mundo novo da globalização, patrocinada pelos nossos melhores quadros intelectuais “progressistas”, implicou o abandono total da utilização do planejamento como instrumento primordial do Estado e a entrega completa do país às forças cegas do mercado.

Ainda assim, no início do novo século, apesar do desalento que já denunciava em algumas entrevistas à imprensa, Furtado mantinha ainda esperanças de ver retomado o projeto de construção da nação. Mas a última delas morreu com a ortodoxia férrea e a defesa dos interesses financeiros que vem caracterizando a política econômica do atual governo. Consta que Lula teria telefonado para Celso Furtado, pouco antes de sua morte, para “justificar” a demissão do professor Carlos Lessa da presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Prestou com isso um tributo ao velho mestre e a suas idéias, mas isso não deve ter sido suficiente para reduzir sua amargura diante do cenário desolador que o governo do amigo está ajudando a aprofundar.

terça-feira, outubro 04, 2005

Angels Fly



How many ears must one man have before he can hear people cry ? (Bob Dylan)

Carlos Henrique de Pontes Vieira


OUR WORLD MAY BE BAD WORLD
OUR WORLD MAY BE GOOD WORLD
ALL DEPENDS ON US
IF WE ARE BAD OR GOOD
WE MAKE OUR DESTINY

EVERYBODY WANTS A HAPPY LIFE
BUT NOBODY WANTS TO CHANGE HIS LIFE
ALL DEPENDS ON US
IF WE ARE IN THE MOOD
TO MAKE OUR HISTORY

CHILDREN DIE
BY ALL MEANS
AND NOBODY CARES
ANGELS FLY
CARRYING DREAMS
LEAVING US NIGHTMARES

OUR WORLD MAY BE BAD WORLD
OUR WORLD MAY BE GOOD WORLD
ALL DEPENDS ON US
IF WE ARE BAD OR GOOD
WE MAKE OUR DESTINY

sábado, outubro 01, 2005

Tratado de Itaipú



Salud, Neruda !










Carlos Henrique de Pontes Vieira

No dia 23 de setembro de 1973 falecia, em Santiago, Pablo Neruda, poeta chileno. Um pouco antes, no dia 11 do mesmo mês, havia ocorrido o golpe militar no Chile, que destituiu o governo constitucional e assassinou o presidente Salvador Allende Gossens, amigo de Neruda. A opinião pública internacional abalada pelos dois acontecimentos subseqüentes tomou conhecimento, estarrecida, de que a casa onde o cadáver desse último estava sendo velado era saqueada e destruída pelas forças golpistas.

Pablo Neruda, pseudônimo de Neftali Ricardo Reyes Basoalto, foi um poeta engajado, politicamente. Com ele, o Chile ganhou, em 1971, o seu segundo prêmio Nobel de literatura. O primeiro havia sido recebido em 1945, concedido à poetisa Gabriela Mistral.

Sua intensa vida política e pública desenvolveu-se a partir da década de 20, enquanto ele se tornava, sucessivamente, cônsul de seu país na Birmânia (1927), no Ceilão (1928), em Java (1930), em Cingapura (1931), na Argentina (1933), na Espanha (1934) e no México (1940). Em 1945, foi eleito Senador pelo povo chileno. Essa atividade política culminou com a sua indicação à Presidência da República, em 1969, honra a que renunciou em favor de Salvador Allende. A partir daí, participou ativamente da campanha da Unidade Popular que elegeu esse último presidente do Chile, em 1970. Nesse ano, Neruda foi nomeado embaixador de seu país, na França.

Saúdo e reverencio Neruda pelo homem, poeta e político que foi. Como homem, soube, como poucos, amar as mulheres. Como poeta, autor de poemas de inspiração social e revolucionária, soube amar a vida. Como político, soube amar a humanidade, sobretudo a sua parcela oprimida a quem deu voz e representatividade.

Salve, Neruda!

A 2ª Guerra e os Direitos Humanos


A essência dos direitos humanos é o direito a ter direitos (Hannah Arendt)
O desastre é filho das ousadias temerárias dos que se comprazem no orgulho desmedido, quando suas casas transbordam de opulência.
(O coro em Agamenon de Ésquilo)

Carlos Henrique de Pontes Vieira - 01 de setembro de 2005

Há 66 anos da madrugada de hoje, no dia 1º de setembro de 1939, era deflagrado o mais desumanizador conflito que a estupidez humana produziu em toda a sua história, por seus horrores e atrocidades.

Iniciava-se, então, com a invasão relâmpago (blitzkrieg) da Polônia pelas temíveis forças armadas da Alemanha nazista, a 2ª guerra mundial que durou 6 anos (1939-1945) e que foi a consequência do impasse, na Conferência Internacional de Versalhes, na solução das questões suscitadas pela 1ª guerra mundial, por isso, a 2ª guerra tem sido considerada por alguns historiadores como a retomada das hostilidades interrompidas em 1918, embora elas sejam profundamente diferentes uma da outra.

A primeira (1914-1918) desenvolveu-se como uma guerra clássica. Como os conflitos imediatamente anteriores, a motivação dos Estados era a de conquistar territórios, mas sem aniquilar os povos inimigos. É bem verdade que, pela novidade do uso de tanques e aviões de combates, a capacidade destrutiva dos meios utilizados se tornou incomparavelmente maior do que a dos conflitos anteriores.

Já a deflagração da segunda guerra (1939-1945) foi baseada em ousadias temerárias, em ambiciosos e arrogantes projetos com o objetivo de subjugar e aniquilar povos considerados inferiores pelo nazi-fascismo. Bem como, a loucura culminante e final da tragédia - o lançamento, pelos Estados Unidos, das duas bombas atômicas sobre a população civil das pacatas Hiroshima (06/08/45) e Nagasaki (09/08/45), cidades que estavam fora do palco de guerra - que no dizer do jurista Fabio Konder Comparato, "soou como um prenúncio de apocalipse: o homem acabara de adquirir o poder de destruir toda a vida na face da terra".

A partir das atrocidades e dos horrores engendrados por este conflito mundial, houve uma tomada de consciência de que a sobrevivência não só da humanidade, mas de todo o planeta, dependia da colaboração de todos os povos para a reorganização das relações internacionais baseadas no incondicional respeito à dignidade do ser humano, sem o qual a convivência pacífica entre as nações seria absolutamente impossível.

Foi neste cenário desolador que, imbuídos do generoso propósito de reconstrução ética da humanidade para uma paz perpétua defendida por Kant desde o século XVIII, foi criada a ONU - Organização das Nações Unidas - cuja idéia inicial encontra-se na Carta do Atlântico assinada pelo Presidente Roosevelt dos Estados Unidos e pelo Primeiro-Ministro Churchill da Inglaterra, no dia 14 de agosto de 1941, em que ansiavam por um mundo fundado em quatro liberdades humanas essenciais: 1. A liberdade de palavra e de expressão; 2. A liberdade de adorar a Deus do modo que for mais conveniente; 3. A libertação da penúria materializada por acordos econômicos que assegurem a todas as nações uma paz sólida; 4. A libertação do medo através da redução de armamentos em escala mundial, de tal forma que nenhuma nação esteja em condições de agredir físicamente outra.

Tantos anos depois, já no alvorecer do século XXI, observamos consternados que o mundo tem ainda muito que avançar para concretizar esses anseios, entretanto, a árdua batalha continua. Em seu livro Delitos de Caráter Internacional, o soviético Igor Karpets assim se expressa: "A busca de soluções positivas com respeito a esses problemas é dever de todos os juristas, porquanto existe um princípio imutável: o direito, a legalidade devem ser sempre e em todos os lugares instrumentos de paz e da defesa dos direitos e das liberdades do homem."

Quero ir para o Folie Bergère - (marcha)






Caíque Vieira

Depois de dias a viajar
e um outro mundo conhecer
o meu desejo era pecar
com um par de pernas me entreter:

chega de islã, de Maomé
quero ir para o Folie Bergère
de balão, faluca ou a pé
só pra ver mocotó de mulher