quarta-feira, janeiro 27, 2010

O Debate da Política Externa: os progressistas

Não é possível conceber uma política externa progressista e inovadora que não questione e enfrente os consensos éticos e estratégicos das potências que controlam o núcleo central do poder mundial.
José Luís Fiori, cientista político, é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro
"Mas, afinal de contas, professor, o que é ser conservador em matéria de política externa? E o que viria a ser uma política externa não conservadora?” J.S.: Leitor do Valor Econômico
As grandes utopias do século XIX revolucionaram as idéias e os objetivos da política internacional, logo no início do século XX. Mas, nas décadas seguintes, seu impacto sobre a política externa das grandes potências, foi bem menor do que as expectativas criadas, num primeiro momento, pelas propostas do presidente americano, Woodrow Wilson, na Conferência de Paz de Paris, depois da 1º Guerra Mundial: cosmopolitas, anti-colonialistas e favoráveis a um sistema mundial de segurança, liderado pela Liga das Nações. E pelas idéias e propostas, quase simultâneas, de Vladimir Lênin, já na condição de chefe do estado russo: internacionalistas, anti-imperialistas e favoráveis à paz e à auto-determinação dos povos.
Um programa convergente, em muitos pontos, e absolutamente inovador, que se transformou na bandeira de luta das duas grandes potências, contra o velho sistema europeu de equilíbrio de poder, e contra o liberalismo colonialista, liderado pela Inglaterra e pela França. Mas depois da morte de Wilson e de Lênin, já nos governos de Warren Harding e Joseph Stalin, os Estados Unidos e a União Soviética adotaram políticas externas orientadas por seus interesses nacionais e pelos seus objetivos internos imediatos, na contramão do discurso de seus antigos governantes.
E depois da 2º Guerra Mundial, e da constituição do “duopólio” que geriu o status quo internacional durante a Guerra Fria, entre 1946 e 1991, as idéias libertárias e internacionalistas do início do século, se transformaram num instrumento ideológico esclerosado, na competição entre as duas grandes potências. Mas apesar disto, estas idéias se difundiram pelo mundo junto com a expansão progressiva do poder americano e soviético, e acabaram se transformando no senso comum pouco inovador, do discurso oficial de todas as lideranças políticas mundiais, e de todos os organismos multilaterais criados depois da guerra.
Por fim, depois da vitória americana, e do fim da Guerra Fria e da União Soviética, em 1991, a velha utopia liberal-democrática se transformou na linguagem imperial do poder vitorioso, válida urbe et orbi. Como se tivesse se estabelecido – por um passe de mágica - uma coincidência absoluta entre os interesses dos Estados Unidos e os interesses do resto da humanidade, e entre as posições dos países que desejam manter, e dos que desejam mudar o atual status quo mundial.
Esta história do século XX, também diz respeito à América Latina, e deixa uma lição importante, para o debate atual, sobre o futuro da política externa brasileira. Os Estados Unidos e a União Soviética sempre tiveram sua própria teoria e sua própria história das relações internacionais, e foram inovadores enquanto lutaram contra a ordem internacional liderada pelo Poder Britânico. E é isto, em última instância, que define a fronteira entre uma política externa conservadora, e uma política progressista. O ponto de partida é simples: um estado e um governo que se proponham expandir o seu poder internacional, inevitavelmente terão que questionar e lutar contra a distribuição prévia do poder, dentro do próprio sistema.
Como condição preliminar, eles terão que ter sua própria teoria e sua própria leitura dos fatos, dos conflitos, e das assimetrias e disputas globais, e de cada um dos “tabuleiros” geopolíticos regionais ao redor do mundo. Para poder estabelecer de forma sustentada e autônoma, os seus próprios objetivos estratégicos, diferentes das potências dominantes, e conseqüentes com sua intenção de mudar a distribuição do poder e da hierarquia mundial. Por isso, não é possível conceber uma política externa progressista e inovadora que não questione e enfrente os consensos éticos e estratégicos das potências que controlam o núcleo central do poder mundial.
Neste campo, não estão excluídas as convergências e as alianças táticas, e temporárias, com uma ou várias das antigas potências dominantes. Mas toda política externa progressista e inovadora, sabe que está e estará em permanente competição com estas potências, e que terá que assumir as suas divergências, com a visão de mundo, com os diagnósticos e com as estratégias defendidas por elas, seja no espaço regional, seja a escala global. Isto não é uma veleidade irrelevante, nem é o fruto de uma animosidade ideológica, é uma conseqüência de uma “lei” essencial do sistema inter-estatal, e de uma determinação que é em grande medida geográfica, porque o objetivo do “estado questionador”, é ampliar sempre e cada vez mais, a sua capacidade de decisão e iniciativa estratégica autônoma, no campo político, econômico e militar, para poder difundir melhor e aumentar a eficácia de suas idéias e propostas de mudança do sistema mundial.
Do lado oposto, fica mais fácil de definir e identificar as características essenciais de uma política externa conservadora. Em primeiro lugar, os conservadores não se propõem mudar a distribuição do poder internacional, nem questionam a hierarquia do sistema mundial. Sua reação frente aos desafios colocados pela agenda internacional, é quase sempre empírica, isolada, e moralista. Os conservadores não têm uma teoria nem uma visão histórica própria do sistema internacional e dos seus acontecimentos conjunturais, e são partidários, em geral, de uma política externa de baixo teor, sem grandes iniciativas estratégicas nacionais, e com uma alta taxa de submissão aos valores, juízos, e decisões estratégicas das potencias dominantes. Por isto, consciente ou inconscientemente, os conservadores delegam a terceiros, uma parte da soberania decisória de sua política externa, e acabam assumindo, invariavelmente, uma posição subalterna dentro da política internacional.
Como foi o caso, na década de 1990, da política externa do Brasil, e dos demais países da América do Sul. Uma década que passou para a história, sob o signo neoliberal da “diplomacia descalça”, do governo brasileiro da época, e da proposta argentina de estabelecer “relações carnais”, com os Estados Unidos.

terça-feira, janeiro 26, 2010

A maior de todas as batalhas

Emir Sader
O maior debate contemporâneo, aquele que reaparece cotidianamente, que praticamente cruza todos os maiores problemas que enfrentamos, é o da solidariedade. O aspecto mais negativo do vendaval avassalador com que o neoliberalismo tratou de se impor em nossas sociedades é o egoísmo. Egoismo, individualismo, consumismo contra solidariedade, justiça, direitos – esta é maior batalhar ideológica e de comportamento, no Brasil e no mundo, atualmente.
As expressões da postura egoísta são muitas: FHC dizia que no Brasil haveria milhões de “inimpregáveis”, isto é, de gente - segundo essa visão – demais, que não cabem “no mercado” – que é o critério da direita para saber quem cabe e quem não cabe. A direita espanhola usa a frase “Não cabemos todos”, para tentar excluir aos imigrantes do alistamento nos serviços sociais.
Se trataria de governar para uma parte da sociedade – um terço, no máximo um pouco mais -, porque se fundam no critério do que cabe no mercado. Não pensam a sociedade como um todo, filtram o que o mercado torna possível, condenando o resto ao abandono.
No Brasil de hoje, um país inquestionavelmente menos injusto do que era antes do governo Lula, se deveria contar com amplo apoio na questão mais importante que o país enfrenta: de ser uma sociedade para todos. Não somos um país pobre, pelos padrões internacionais, mas somos o país mais injusto, do continente mais injusto.
Injusto, não pela miséria generalizada, mas pela distribuição de renda super desigual, entre os pólos de riqueza e de pobreza. O tema do “país para todos” deveria ser o critério essencial para definir a natureza do Brasil hoje, a quantas andamos, que futuro queremos para o país.
Porém é de temer que o critério da situação de cada um – especialmente nos setores de classe média – seja o essencial. Enquanto a economia crescer e atender as demandas de grande parte da população, as pessoas se sentem contentes, apóiam o governo Lula. Não parece que a extensão dos direitos aos até aqui sempre excluídos, os processos de distribuição de renda, o aumento sistemático do nível de emprego formal, entre outros aspectos inegavelmente positivos, sejam os critérios básicos para nortear o ponto de vista político das pessoas.
Para a direita, é claro, se trata de tentar impedir que esse processo prossiga. Seu maior fantasma é o de uma adesão duradoura do povo a projetos de justiça social. Ela se ampara no mercado e nos seus critérios seletivos e excludentes.
Para a esquerda, se trata de travar a maior de todas as batalhas: a luta pela construção de idéias solidárias, de fraternidade, de justiça, fundadas no direito de todos. Sem isso, se poderá avançar, conforme o sucesso econômico e a possibilidade de extensão do acesso a bens para todos. Porém, nosso critério tem que ser o da prioridade radical de incorporação aos direitos básicos dos pobres, da grande maioria, até aqui sempre marginalizada, do Brasil.
Ajudar a que tomem consciência dos seus direitos, de quem são seus inimigos, de como podem e devem se organizar para garantir seus interesses e a continuidade dos projetos que os beneficiam. Ajudar a que sejam o sujeito fundamental na construção de um país justo, solidário, para todos. Aí se joga o futuro do país: na superação do egoísmo, do consumismo, dos critérios de mercado, pelos de justiça, de solidariedade, de direito para todos.

sexta-feira, janeiro 15, 2010

La lección de Haití

Fidel Castro

Desde hace dos días, casi a las 6 de la tarde, hora de Cuba, ya de noche en Haití por su ubicación geográfica, las emisoras de televisión comenzaron a divulgar noticias de que un violento terremoto, con magnitud de 7,3 en la escala Richter, había golpeado severamente a Puerto Príncipe. El fenómeno sísmico se había originado en una falla tectónica ubicada en el mar, a sólo 15 kilómetros de la capital haitiana, una ciudad donde el 80% de la población habita casas endebles construidas con adobe y barro.

Las noticias continuaron casi sin interrupción durante horas. No había imágenes, pero se afirmaba que muchos edificios públicos, hospitales, escuelas e instalaciones de construcción más sólida se reportaban colapsadas. He leído que un terremoto de magnitud 7,3 equivale a la energía liberada por una explosión igual a 400 mil toneladas de TNT.

Descripciones trágicas eran transmitidas. Los heridos en las calles reclamaban a gritos auxilios médicos, rodeados de ruinas con familias sepultadas. Nadie, sin embargo, había podido transmitir imagen alguna durante muchas horas.

La noticia nos tomó a todos por sorpresa. Muchos escuchábamos con frecuencia informaciones sobre huracanes y grandes inundaciones en Haití, pero ignorábamos que el vecino país corría riesgo de un gran terremoto. Salió a relucir esta vez que hace 200 años se había producido un gran sismo en esa ciudad, que seguramente tendría unos pocos miles de habitantes.

A las 12 de la noche no se mencionaba todavía una cifra aproximada de víctimas. Altos jefes de Naciones Unidas y varios Jefes de Gobierno hablaban de los conmovedores sucesos y anunciaban el envío de brigadas de socorro. Como hay desplegadas allí tropas de la MINUSTAH, fuerzas de Naciones Unidas de diversos países, algunos ministros de defensa hablaban de posibles bajas entre su personal.

Fue realmente en la mañana de ayer miércoles cuando comenzaron a llegar tristes noticias sobre enormes bajas humanas en la población, e incluso instituciones como Naciones Unidas mencionaban que algunas de sus edificaciones en ese país habían colapsado, una palabra que no dice nada de por sí o podía significar mucho.

Durante horas ininterrumpidas continuaron llegando noticias cada vez más traumáticas de la situación en ese hermano país. Se discutían cifras de víctimas mortales que fluctúan, según versiones, entre 30 mil y 100 mil. Las imágenes son desoladoras; es evidente que el desastroso acontecimiento ha recibido amplia divulgación mundial, y muchos gobiernos, sinceramente conmovidos, realizan esfuerzos por cooperar en la medida de sus recursos.

La tragedia conmueve de buena fe a gran número de personas, en especial las de carácter natural. Pero tal vez muy pocos se detienen a pensar por qué Haití es un país tan pobre. ¿Por qué su población depende casi en un 50 por ciento de las remesas familiares que se reciben del exterior? ¿Por qué no analizar también las realidades que conducen a la situación actual de Haití y sus enormes sufrimientos?

Lo más curioso de esta historia es que nadie pronuncia una palabra para recordar que Haití fue el primer país en que 400 mil africanos esclavizados y traficados por los europeos se sublevaron contra 30 mil dueños blancos de plantaciones de caña y café, llevando a cabo la primera gran revolución social en nuestro hemisferio. Páginas de insuperable gloria se escribieron allí. El más eminente general de Napoleón fue derrotado. Haití es producto neto del colonialismo y el imperialismo, de más de un siglo de empleo de sus recursos humanos en los trabajos más duros, de las intervenciones militares y la extracción de sus riquezas.

Este olvido histórico no sería tan grave como el hecho real de que Haití constituye una vergüenza de nuestra época, en un mundo donde prevalecen la explotación y el saqueo de la inmensa mayoría de los habitantes del planeta.

Miles de millones de personas en América Latina, África y Asia sufren de carencias similares, aunque tal vez no todas en una proporción tan alta como Haití.

Situaciones como la de ese país no debieran existir en ningún lugar de la Tierra, donde abundan decenas de miles de ciudades y poblados en condiciones similares y a veces peores, en virtud de un orden económico y político internacional injusto impuesto al mundo. A la población mundial no la amenazan únicamente catástrofes naturales como la de Haití, que es sólo una pálida sombra de lo que puede ocurrir en el planeta con el cambio climático, que fue realmente objeto de burla, escarnio y engaño en Copenhague.

Es justo expresar a todos los países e instituciones que han perdido algunos ciudadanos o miembros con motivo de la catástrofe natural en Haití: no dudamos que realizarán en este instante el mayor esfuerzo por salvar vidas humanas y aliviar el dolor de ese sufrido pueblo. No podemos culparlos del fenómeno natural que ha tenido lugar allí, aunque estemos en desacuerdo con la política seguida con Haití.

No puedo dejar de expresar la opinión de que es hora ya de buscar soluciones reales y verdaderas para ese hermano pueblo.

En el campo de la salud y otras áreas, Cuba, a pesar de ser un país pobre y bloqueado, desde hace años viene cooperando con el pueblo haitiano. Alrededor de 400 médicos y especialistas de la salud prestan cooperación gratuita al pueblo haitiano. En 227 de las 237 comunas del país laboran todos los días nuestros médicos. Por otro lado, no menos de 400 jóvenes haitianos se han formado como médicos en nuestra Patria. Trabajarán ahora con el refuerzo que viajó ayer para salvar vidas en esta crítica situación. Pueden movilizarse, por lo tanto, sin especial esfuerzo, hasta mil médicos y especialistas de la salud que ya están casi todos allí y dispuestos a cooperar con cualquier otro Estado que desee salvar vidas haitianas y rehabilitar heridos.

Otro elevado número de jóvenes haitianos cursan esos estudios de medicina en Cuba.

También cooperamos con el pueblo haitiano en otras esferas que están a nuestro alcance. No habrá, sin embargo, ninguna otra forma de cooperación digna de calificarse así, que la de luchar en el campo de las ideas y la acción política para poner fin a la tragedia sin límite que sufren un gran número de naciones como Haití.

La jefa de nuestra brigada médica informó: “la situación es difícil, pero hemos comenzado ya a salvar vidas”. Lo hizo a través de un escueto mensaje horas después de su llegada ayer a Puerto Príncipe con refuerzos médicos adicionales.

Tarde en la noche comunicó que los médicos cubanos y los haitianos graduados de la ELAM se estaban desplegando en el país. Habían atendido ya en Puerto Príncipe más de mil pacientes, poniendo a funcionar con urgencia un hospital que no había colapsado y utilizando casas de campaña donde era necesario. Se preparaban para instalar rápidamente otros centros de atención urgente.

¡Sentimos un sano orgullo por la cooperación que, en estos instantes trágicos, los médicos cubanos y los jóvenes médicos haitianos formados en Cuba están prestando a sus hermanos de Haití!

terça-feira, janeiro 12, 2010

EUA já têm 13 bases militares em torno da Venezuela

Ignacio Ramonet

A chegada de Hugo Chávez ao poder, na Venezuela, em 2 de fevereiro de 1999, coincidiu com um acontecimento militar traumático para os Estados Unidos: o fechamento de sua principal instalação militar na região, a base Howard, situada no Panamá (fechada em virtude dos Tratados Torrijos-Carter, de 1977).
Em troca, o Pentágono escolheu quatro localidades para controlar a região: Manta, no Equador; Comalapa, em El Salvador, e as ilhas de Aruba e Curazao (de soberania holandesa). A suas – por assim dizer –“tradicionais” missões de espionagem, acrescentou novas atribuições oficiais a estas bases (vigiar o narcotráfico e combater a imigração clandestina para os EUA) e outras tarefas encobertas: lutar contra os insurgentes colombianos; controlar os fluxos de petróleo e minerais, os recursos de água doce e a biodiversidade. Mas, desde o início, seus principais objetivos foram vigiar a Venezuela e desestabilizar a Revolução Bolivariana.
Após os atentados de 11 de setembro de 2001, o Secretário de Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld, definiu uma nova doutrina militar para enfrentar o “terrorismo internacional”. Modificou a estratégia de deslocamento no exterior, fundada na existência de enormes bases dotados de numeroso pessoal. E decidiu substituir essas mega-bases por um número mais elevado de Foreing Operating Location (FOL) e de Cooperative Security Locations (CSL), com pouco pessoal militar, mas equipado com tecnologias ultramodernas de detecção.
Resultado: em pouco tempo, a quantidade de instalações militares estadunidenses no estrangeiro de multiplicou, alcançando a insólita soma de 865 bases de tipo FOL ou CSL distribuídas em 46 países. Jamais na história uma potência multiplicou de tal modo seus postos militares de controle para espalhar-se pelo planeta.
Na América Latina, a reorganização de bases permitiu que a de Manta (Equador) colaborasse com o fracassado golpe de Estado de 11 de abril de 2002 contra o presidente Chávez. A partir daí, uma campanha midiática dirigida por Washington começou a difundir falsas informações sobre a suposta presença neste país de céculas de organizações como Hamás, Hezbolá e até Al Qaeda.
Com o pretexto de vigiar tais movimentos e em represália contra o governo de Caracas que, em maio de 2004, pôs fim a meio século de presença militar estadunidense na Venezuela, o Pentágono ampliou o uso de suas bases militares nas ilhas de Aruba e Curazao, situadas muito perto das costas venezuelanas, onde ultimamente tem se incrementado a visita de navios de guerra dos EUA. Esse fato foi recentemente denunciado pelo presidente Chávez:
“É bom que a Europa saiba que o império norte-americano está armando-se até os dentes, enchendo de aviões e navios de guerra as ilhas de Aruba e Curazao. (...) Estou acusando a Holanda de estar preparando, junto com o império yanqui, uma agressão contra a Venezuela”.
Em 2006, começa-se a falar em Caracas do “socialismo do século XXI, nasce a Aliança Bolivariana para as Américas (ALBA) e Hugo Chávez é reeleito presidente. Washington reage impondo um embargo sobre a venda de armas para a Venezuela, sob o pretexto de que Caracas “não colabora suficientemente na guerra contra o terrorismo”. Os aviões F-16 da Força Aérea Venezuela ficaram sem peças de reposição. Diante desta situação, as autoridades venezuelanas estabeleceram um acordo com a Rússia para dotar a sua força aérea de aviões Sukhoi. Washington denunciou um suposto “rearmamento massivo” da Venezuela, omitindo que os principais orçamentos militares na América Latina, hoje, são os do Brasil, da Colômbia e do Chile. E que, a cada ano, a Colômbia recebe uma ajuda militar estadunidense de 630 milhões de dólares.
A partir daí, os acontecimentos se aceleram. No dia 1° de março de 2008, apoiadas pela base de Manta, as forças colombianas atacam um acampamento das Forças Armadas Revolucionarias da Colômbia (FARC), situado no interior do território do Equador. Quito, em represália, decide não renovar o acordo sobre a base de Manta, que vencia em novembro de 2009. Washington respondeu, no mês seguinte, com a reativação da IV Frota (desativada em 1948, há 60 anos...) cuja missão é vigiar a costa atlântica da América do Sul. Um mês mais tarde, os Estados sulamericanos, reunidos em Brasília, replicam criando a União de Nações Sulamericanas (UNASUL) e, em março de 2009, o Conselho de Defesa Sulamericano.
Algumas semanas depois, o embaixador do EUA em Bogotá anuncia que a base de Manta seria transferida para Palanquero, na Colômbia.
Em junho, com o apoio da base estadunidense de Soto Cano, se produz o golpe de Estado em Honduras contra o presidente Manuel Zelaya que havia conseguido integrar seu país na ALBA. Em agosto, o pentágono anuncia que terá sete novas bases militares na Colômbia. E, em outubro, o presidente conservador do Panamá, Ricardo Martinelli, admite que cedeu aos EUA o uso de quatro novas bases militares.
Deste modo, a Venezuela e a Revolução Bolivariana se vêem hoje rodeadas por nada menos do que 13 bases estadunidenses na Colômbia, Panamá, Aruba e Curazao, assim como pelos porta-aviões e navios de guerra da IV Frota. O presidente Obama parece ter deixado o Pentágono de mãos livres neste tema. Tudo anuncia uma agressão iminente. Os povos da América Latina consentirão que um novo crime contra a democracia seja cometido na região?

segunda-feira, janeiro 11, 2010

O porre










Caíque Vieira

Durante o tempo seguinte
Nada mais se ouve na casa
Olho o relógio: uma e vinte
E ao pensamento dou asa

A água forte que alucina
Bebo agora em gole ardente
E o que penso me fascina
Tudo revolvo na mente

Da garrafa um quarto ou um quinto
Vou transpondo a madrugada
Dou-me conta que o que sinto
É a ébria alma extasiada

A memória já esmaecida
Fruto do homérico porre
Ouço o bardo inglês que acorre:
“Longo é o amor, breve é a vida.”

quarta-feira, janeiro 06, 2010

É a treva: rumo ao desastre

Leonardo Boff - Teólogo, filósofo e escritor

Uma jovem e talentosa atriz de uma novela muito popular, Beatriz Drumond, sempre que fracassam seus planos, usa o bordão: ‘É a treva’. Não me vem à mente outra expressão ao assistir o melancólico desfecho da COP 15 sobre as mudanças climáticas em Copenhague: é a treva! Sim, a humanidade penetrou numa zona de treva e de horror. Estamos indo ao encontro do desastre. Anos de preparação, dez dias de discussão, a presença dos principais líderes políticos do mundo não foram suficientes para espancar a treva mediante um acordo consensuado de redução de gases de efeito estufa que impedisse chegar a dois graus Celsius. Ultrapassado esse nível e beirando os três graus, o clima não seria mais controlável e estaríamos entregues à lógica do caos destrutivo, ameaçando a biodiversidade e dizimando milhões e milhões de pessoas.

O Presidente Lula, em sua intervenção no dia mesmo do encerramento, 18 de dezembro, foi a único a dizer a verdade: faltou-nos inteligência porque os poderosos preferiram barganhar vantagens a salvar a vida da Terra e os seres humanos.

Duas lições se podem tirar do fracasso em Copenhague: a primeira é a consciência coletiva de que o aquecimento é um fato irreversível, do qual todos somos responsáveis, mas principalmente os países ricos. E que agora somos também responsáveis, cada um em sua medida, do controle do aquecimento para que não seja catastrófico para a natureza e para a humanidade. A consciência da humanidade nunca mais será a mesma depois de Copenhague. Se houve essa consciência coletiva, por que não se chegou a nenhum consenso acerca das medidas de controle das mudanças climáticas?

Aqui surge a segunda lição que importa tirar da COP 15 de Copenhague: o grande vilão é o sistema do capital com sua correspondente cultura consumista. Enquanto mantivermos o sistema capitalista mundialmente articulado será impossível um consenso que coloque no centro a vida, a humanidade e a Terra e se tomar medidas para preservá-las. Para ele centralidade possui o lucro, a acumulação privada e o aumento de poder de competição. Há muito tempo que distorceu a natureza da economia como técnica e arte de produção dos bens necessários à vida. Ele a transformou numa brutal técnica de criação de riqueza por si mesma sem qualquer outra consideração. Essa riqueza nem sequer é para ser desfrutada mas para produzir mais riqueza ainda, numa lógica obsessiva e sem freios.

Por isso que ecologia e capitalismo se negam frontalmente. Não há acordo possível. O discurso ecológico procura o equilíbrio de todos os fatores, a sinergia com a natureza e o espírito de cooperação. O capitalismo rompe com o equilíbrio ao sobrepor-se à natureza, estabelece uma competição feroz entre todos e pretende tirar tudo da Terra, até que ela não consiga se reproduzir. Se ele assume o discurso ecológico é para ter ganhos com ele.

Ademais, o capitalismo é incompatível com a vida. A vida pede cuidado e cooperação. O capitalismo sacrifica vidas, cria trabalhadores que são verdadeiros escravos ‘pro tempore’ e pratica trabalho infantil em vários países.

Os negociadores e os lideres políticos em Copenhague ficaram reféns deste sistema. Esse barganha; quer ter lucros; não hesita em por em risco o futuro da vida. Sua tendência é autosuicidária. Que acordo poderá haver entre os lobos e os cordeiros, quer dizer, entre a natureza que grita por respeito e os que a devastam sem piedade?

Por isso, quem entende a lógica do capital, não se surpreende com o fracasso da COP 15 em Copenhague. O único que ergueu a voz, solitária, como um louco numa sociedade de sábios, foi o presidente Evo Morales: Ou superamos o capitalismo ou ele destruirá a Mãe Terra.

Gostemos ou não gostemos, esta é a pura verdade. Copenhague tirou a máscara do capitalismo, incapaz de fazer consensos porque pouco lhe importa a vida e a Terra, mas antes as vantagens e os lucros materiais.

sexta-feira, janeiro 01, 2010

Pelé, Maradona e Nietzsche


Se não vês o brilho da estrela na noite escura, a culpa não é da estrela mas de ti mesmo. (Leonardo Boff)

Caíque Vieira

O brasileiro Pelé e o argentino Maradona, estrelas de primeira grandeza do futebol de todos os tempos, são frequentemente comparados, antagonizados e classificados: um é o escolhido e o outro é excluído. Se alguém elogia o Maradona, logo vem um entusiasta passional para contestar e dizer que o nosso Pelé era melhor. Puro chauvinismo, ufanismo nacionalista, a eterna rivalidade entre Brasil e Argentina.

Ambos eram verdadeiros artistas da pelota com suas memoráveis jogadas. Em um se encontrava o rigor técnico, o equilíbrio perfeito do corpo, a visão panorâmica do campo, o passe preciso e genial. No outro assistíamos a irreverência, a rapidez de dribles desconcertantes, o canhotaço e a apoteose. Dois deuses em campo.

A expressão “Apolíneo-Dionisíaco” popularizada por Nietzsche no livro “O nascimento da tragédia”, relativa ao que vem dos deuses Apolo e Dionísio, é tratada como dois pólos dialéticos, entre o espírito da ordem, da racionalidade e da harmonia intelectual, representado por Apolo, e o espírito da vontade de viver espontânea e extasiada, representado por Dionísio. São conceitos antitéticos, mas de uma espécie dialética necessária à existência de todos os homens.

Sempre que participo dessas discussões sobre quem é melhor, associo-os a esse conceito de Nietzsche, Pelé expressando o espírito apolíneo e Maradona, como o nosso também genial Garrincha, refletindo o espírito dionisíaco, dois caracteres diferentes e necessários à evolução progressiva da arte de jogar futebol, tal como a dualidade dos sexos gera a vida no meio de lutas permanentes e aproximações periódicas.

O brasileiro e o argentino não se excluem entre si, como pretendem os passionais e parciais aficionados do futebol, parece terem firmado uma aliança de soberania, já que ambos são idolatrados, aliança de deuses superiores da epifania principal celebrada nos campos de futebol.