quarta-feira, junho 23, 2010

E agora, qual capitalismo?

"O pensamento que criou o problema não pode ser o mesmo que o solucionará". (Albert Einstein)
Caíque Vieira - Advogado

Após o mercantilismo no século XV, surgiu o capitalismo vigente até hoje de forma praticamente universal. Desde então, já foram mais de cinco séculos e eis os números e suas fontes que mostram a absoluta incompetência desse modo de produção para resolver os problemas básicos da humanidade:

População mundial: 6,8 bilhões, dos quais...

• 1,02 bilhão são desnutridos crônicos (FAO, 2009)
• 2 bilhões não possuem acesso a medicamentos (www.fic.nih.gov)
• 884 milhões não têm acesso à água potável (OMS/UNICEF, 2008)
• 924 milhões estão "sem teto" ou em moradias precárias (UN Habitat, 2003)
• 1,6 bilhão não têm eletricidade (UN HABITAT, "Urban Energy")
• 2,5 bilhões não têm sistemas de drenagens ou saneamento (OMS/UNICEF, 2008)
• 774 milhões de adultos são analfabetos (www.uis.unesco.org)
• 18 milhões de mortes por ano devido à pobreza, a maioria menores de 5 anos (OMS).
• 218 milhões de crianças, entre 5 e 17 anos, trabalham precariamente em condições de escravidão e em tarefas perigosas ou humilhantes, como soldados, prostitutas, serventes, na agricultura, na construção ou indústria têxtil (OIT: A eliminação do trabalho infantil: um objetivo ao nosso alcance, 2006).
Este é o problema e, segundo Einstein citado na epígrafe acima, o pensamento que o criou não poderá ser o mesmo que o solucionará.
O capitalismo já foi experimentado em suas duas grandes vertentes: sem Estado e com Estado.

A primeira vertente, o liberalismo, defende as forças produtivas livres do controle do Estado, tendo como mecanismo regulador apenas as leis de mercado. Essa vertente já sofreu duas grandes “débâcles”, a de 1929, e a de 2008, esta última deflagrada após seu ressurgimento com força total na década de 90 do século XX.

A sua segunda vertente, a social democracia, surgiu após a crise do liberalismo de 1929. Para concorrer com o sucesso da grande rival, a União Soviética, a classe dominante do capitalismo ocidental aceitou, a contragosto, um pouco de Estado no modelo para atuar como indutor do crescimento da economia e como patrocinador da assistência aos carentes e excluídos da sociedade, tão disseminados como mostrado acima. Só que essa mesma classe dominante se opõe sempre que o Estado tributa para fazer face a essas despesas com as crianças, os velhos e os incapazes para o trabalho, contingente que existe em todas as sociedades humanas. E agora, em 2010, estamos presenciando o que parece ser a sua grande falência iniciada na Europa: Grécia e outros países. Certamente, contaminará todo o mundo.

Mesmo assim, há ferrenhos defensores deste modo de produção, são eles: 1. os de boa fé, produto de sua ignorância pelo fato de que, como dizia Karl Marx, devido a falta de transparência do sistema, a sua natureza exploradora e predatória não fica evidente aos olhos de mulheres e homens comuns atarefados com as suas subsistências e preocupados com os seus cotidianos problemas e de seus familiares; 2. os que são seus grandes beneficiários e amealham enormes fortunas graças às suas injustiças e iniquidades; 3. os ideólogos desse modo de produção que conhecem perfeitamente bem os custos sociais que o sistema impõe em termos de degradação humana e ambiental. Só que eles são regiamente pagos para enganar as pessoas e seguem com sua defesa.

Entre 1988 e 2002, os 25% mais pobres da população mundial reduziram sua participação na renda global de 1,16% para 0,92%, enquanto os 10% mais ricos acrescentaram 6,4% a mais às suas fortunas, de 64,7% para 71,1% da riqueza mundial. Poucos enriquecem às custas de muitos que empobrecem.

Segundo Atílio Boron, grande estudioso das mazelas do capitalismo e a quem devo todas estas informações que usei para elaborar este texto, somente esses 6,4% de enriquecimento adicional dos mais opulentos seriam suficientes para duplicar a renda de 70% da população mundial, salvando vidas e reduzindo os sofrimentos dos mais pobres. Mas nem isso, algo tão elementar, é aceitável para as classes dominantes do capitalismo mundial.

Há um imperativo categórico que é atender as necessidades dos excluídos de nossas complexas sociedades humanas. Diante desses dados e fatos, dos fracassos das experiências capitalistas sem Estado e com Estado, uma simples pergunta se faz necessária para que os defensores deste pensamento econômico respondam: e agora, qual capitalismo?

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