segunda-feira, março 30, 2009

A boa fonte


Tendo sentido o inconveniente da dependência, prometi a mim mesmo que não mais me haveria de expor a ela." No original: "Ayant senti l'inconvenient de la dépendence, je me promis bien de ne m'y plus exposer". ( Jean-Jacques Rousseau)

Carlos Henrique de Pontes Vieira

Cedo percebi as enormes diferenças sociais entre nós, mas só há alguns anos, com o aperfeiçoamento na elaboração dos índices econômicos, é que fiquei sabendo que somos quase a lanterna do mundo em distribuição de renda. Impregnado desse mal-estar e na esperança de uma política que melhorasse esse indicador é que sempre fui eleitor da esquerda.

Tenho amigos e conhecidos de todos os matizes políticos, desde a extrema esquerda até a extrema direita. Esses extremos sempre acharam que estou do outro lado. Os da esquerda me chamam de burguês e os da direita me chamam de vermelho. Sempre foi assim, desde os tempos da faculdade.

Eu gostava de compor ao piano e um dia compus uma canção em homenagem às boas temporadas em Fleicheiras. Essa canção chama-se "Dolce far niente" que é uma expressão cunhada por um escritor considerado burguês pela esquerda. Um amigo comunista quando a ouviu pela primeira vez, apontou os dedos como uma arma na minha direção e vi seus lábios fuzilarem: “¡ paredon !"

Na eleição do Collor, quando amargávamos a derrota do Lula, compus uma quadrinha: Dias melhores virão / Pra aqueles que ora choram / Se os crisântemos descoram / Tolos "descollorirão". Quando um tio muito querido, "collorido", a ouviu, esbravejou: "comunista, pior ainda porque é poeta !" Afinal, não sou nem uma coisa nem outra.

Na década de setenta, entrei em contato com o pensamento político de Paulo Bonavides de quem fui aluno na disciplina Ciência Política da Escola de Administração da UECE, e com o pensamento econômico de Celso Furtado, através de um de seus livros estudado em sala de aula na disciplina de Introdução à Economia. Imediatamente me identifiquei com esses dois patrimônios da cultura nacional, paraibanos de nascimento, homens de sensibilidade que se debruçaram sobre as ciências que escolheram e, brilhantemente, nos oferecem soluções para os nossos seculares entraves político e econômico, mas que insistimos em refutá-las.

Encantei-me com o pensamento do professor Bonavides, pela radicalidade de sua democracia rousseauniana, a sua proposta do quarto nível federativo regional; e de Celso Furtado, por seus estudos avançados na Cepal, com uma teoria desenvolvimentista para o Brasil e a América Latina. Esses dois pensamentos estão hoje mais do que justificados pelas seguidas crises na política e na economia.

Essa é a fonte boa e cristalina de que tenho me servido para um aperfeiçoamento como cidadão com alguma consciência política, social e econômica. Pensadores da melhor estirpe, prata da casa, que deveriam ser lidos e assimilados pela grande maioria de nós, brasileiros, se tivéssemos amor à independência, à justiça e respeito ao que é nosso.

Um comentário:

Polyne disse...

Querido tio Caíque,
como é bom saber onde fica a fonte! Cada vez que leio algo aqui, lembro de outro algo que também me toca. Agora lembrei daquela música do Guilherme Arantes "Planeta Água". Essa música me toca profundamente. Aqui vai a letra dela: http://letras.terra.com.br/guilherme-arantes/46315/
Beijo,
Polyne