No
que consiste a receita de austeridade que esmaga a Grécia (leia a análise de
Marco Aurélio Weissheimer; nesta pag.), solapa a Itália, esfarela Portugal e
Espanha entre outros? Grosseiramente,
trata-se de montar uma máquina capaz de
pagar os juros aos credores. A meta é
dar solvência a uma dívida contraída em regime de cumplicidade imprevidente - entre
bancos e governos e entre bancos locais e estrangeiros - prática essa tida como exemplo das virtudes da livre
ciculação de capitais , cantada em prosa e verso na farra especulativa que antecedeu ao colapso de 2008.Como funciona a engrenagem desse
colosso excretor de juros? De novo, em síntese rudimentar, trata-se de arrochar
o consumo público e privado, ancorando a geração de caixa nas exportações. Daí
a opressão laboral e os cortes de salário mínimo e aposentadorias exigidos
pelos centuriões do euro, comandados pela generala Merkel , tendo na garupa seu
petit Napoleão, Sarkozy. Daí também o
desmonte da esfera pública, com a supressão de serviços essenciais, a demissão
maciça de funcionários e a
contração irrestrita de
investimentos. O ajuste europeu poderá gerar um colapso social até mais
dramático que o produzido na crise da dívida externa vivida pelos países da
América Latina, nos anos 80. Naquele caso, o recurso à desvalorização cambial
como alavanca de impulso exportador, embora convergisse igualmente para a perda
de poder aquisitivo dos trabalhadores - e era esse o objetivo - não impactava
de forma direta e na mesma proporção o bolso de todos os assalariados. No caso
europeu, a união em torno de uma moeda supranacional de valor interno fixo
impede o ajuste cambial caso a caso. É preciso ir diretamente ao bolso do
cidadão confiscar poder aquisitivo. A tal ponto que em Portugal, o governo
Pereira Passos tentou ressuscitar a mais valia absoluta, elevando em meia hora
diária a carga de trabalho, sem remuneração. É com base nesse torniquete que se
pretende reerguer as sociedades afogadas na crise do euro, a partir de uma
improvável e avassaladora explosão das exportações em cada país. As metas de
receita no comércio exterior são
superlativas e fantasiosas, sobretudo por um detalhe: se o mundo está em crise
e todos querem exportar, quem dará as ordens
de compras necessárias à redenção da engrenagem conservadora? A conta
não fecha. A sangria social tende a assumir proporções hemorrágicas de um empobrecimento sem paralelo. Uma espécie
de argentinização européia. Na crise produzida pelo governo Menen, a
escolarizada e próspera sociedade argentina viram 50% de sua população deslizar
para baixo da linha da pobreza. Então as ruas explodiram.
(Carta
Maior; 5ª feira; 16/02/ 2012)
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