quinta-feira, janeiro 07, 2016

Diálogos e convergências



Diálogos e convergência 

De vez em quando, há um certo estranhamento dos outros em relação à minha posição política mais à esquerda, já que sou neto e filho de empresários. Essa posição já expliquei no texto "A boa fonte".

Meu avô morreu dois dias antes do meu aniversário de 13 anos, nessa idade não temos consciência política. Soube, mais tarde, que ele não gostava de Getúlio Vargas e se entristecia com um filho, meu tio, que gostava. Quanto a mim, não tinha a menor ideia quanto a política e a ideologia provocam paixões que podem destruir relacionamentos, eu simplesmente gostava do meu avô e não seria a ideologia que destruiria esse bem-querer.

A minha convivência com meu pai foi constituída por duas fases que correspondem a dois sentimentos: a primeira, a da infância, onde predominava o medo que eu tinha dele. Nessa fase eu poderia até dizer que eu gostava mais do meu avô do que dele. Meu avô era para mim uma figura masculina mais carinhosa; e a segunda, a da juventude, quando começamos a jogar futebol, a dialogar e a convergir. De início, conversávamos muito sobre música (ambos tocamos piano), depois sobre a segunda guerra mundial e, mais tarde, sobre política. Nessa fase começa minha grande afeição por ele, este é o sentimento que predomina. Todo meu gosto pelo jazz vem daí, assim como meu interesse por geopolítica se inicia pelas informações que ele me dava sobre a segunda guerra. Na política divergíamos, ele pendia para a direita e eu para a esquerda, mas há uma curiosidade que poucos sabem: em 1986 surge um jornal semanal alternativo, o JD (Jornal do Dorian), cujo diretor era o Dorian Sampaio e o editor, o Blanchard Girão, dois jornalistas de esquerda que eram amigos de meu pai. Nós dois assinamos o JD e sempre conversávamos sobre os assuntos da semana, principalmente sobre a coluna do Blanchard. Comecei a notar alterações no ponto de vista político dele, uma leve guinada à esquerda, e à nossa convergência. Em uma das semanas, li na coluna do Blanchard a carta de um anônimo que me pareceu familiar pelos pontos de vista que pareciam com os do meu pai e lá no final o autor se identifica como um ex locutor da PRE-9. Pronto, deve ser o papai, imaginei. À noite fui na casa dele que me confirmou. Mas não era o primeiro sinal de simpatia dele pela esquerda, em 1985 ele havia votado na Maria Luiza Fontenele para prefeita de Fortaleza.

Escaneei a carta que está publicada abaixo. Este JD circulou no dia 24 de julho de 1986. No ano seguinte, no dia 20 de abril de 1987, meu pai faleceu e, poucos meses depois, fui assistir a uma palestra do Blanchard Girão onde, no final, me apresentei a ele com o jornal em mãos. Ele me deu um caloroso abraço e me disse que desconfiava que a carta era de meu pai pela menção à PRE-9.

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